Explicação do que é bônus-hora, ou horas de serviço ao próximo, mostrando a eterna continuidade da vida...
Antonio Carlos Piesigilli
Notando que a senhora Laura entristecera subitamente ao
recordar o marido, modifiquei o rumo da palestra, interrogando:
- Que me diz do
Bônus-Hora?
Trata-se de algum metal amoedado?
Minha interlocutora perdeu o
aspecto cismativo, a que se recolhera, e replicou, atenciosa:
- Não é
propriamente moeda, mas ficha de serviço individual, funcionando como valor
aquisitivo.
- Aquisitivo? - perguntei abruptamente.
- Explico-me - respondeu a
bondosa senhora -;
em "Nosso Lar" a produção de vestuário e
alimentação elementares pertence a todos em comum.
Há serviços centrais de
distribuição na Governadoria e departamentos do mesmo trabalho nos Ministérios.
O celeiro fundamental é propriedade coletiva.
Ante meu gesto silencioso de espanto, acentuou:
- Todos cooperam no engrandecimento do patrimônio comum e
dele vivem.
Os que trabalham, porém, adquirem direitos justos.
Cada habitante de "Nosso Lar" recebe provisões de
pão e roupa, no que se refere ao estritamente necessário; mas os que se
esforçam na obtenção do bônus-hora conseguem certas prerrogativas na comunidade
social.
O espírito que ainda não trabalha, poderá ser abrigado aqui;
no entanto, os que cooperem podem ter casa própria.
O ocioso vestirá, sem dúvida; mas o operário dedicado
vestirá o que melhor lhe pareça; compreendeu?
Os inativos podem permanecer nos campos de repouso, ou nos
parques de tratamento, favorecidos pela intercessão de amigos; entretanto, as
almas operosas conquistam o bônus-hora e podem gozar a companhia de irmãos
queridos, nos lugares consagrados ao entretenimento, ou o contacto de
orientadores sábios, nas diversas escolas dos Ministérios em geral.
Precisamos conhecer o preço de cada nota de melhoria e
elevação.
Cada um de nós, os que trabalhamos, deve dar, no mínimo, oito horas
de serviço útil, nas vinte e quatro de que o dia se constitui.
Os programas de trabalho, porém, são numerosos e a
Governadoria permite quatro horas de esforço extraordinário, aos que desejem
colaborar no trabalho comum, de boa-vontade.
Desse modo, há muita gente que consegue setenta e dois
"Bônus-Hora", por semana, sem falar dos serviços sacrificiais, cuja
remuneração é duplicada e, às vezes, triplicada.
- Mas, é esse o único título de remuneração? - perguntei.
- Sim, é o padrão de pagamento a todos os colaboradores da
colônia, não só na administração, como também na obediência.
Lembrando as organizações terrestres, indaguei, espantado:
- Todavia, como conciliar semelhante padrão com a natureza
do serviço?
O administrador ganhará oito bônus-hora na atividade normal do dia,
e o operário do transporte receberá a mesma coisa?
Não é o trabalho do primeiro
mais elevado que o do segundo?
A senhora sorriu à pergunta e explicou:
- Tudo é relativo.
Se, na orientação ou na subalternidade, o
trabalho é de sacrifício pessoal, a expressão remunerativa é justamente
multiplicada.
Examinando, porém, mais detidamente a sua pergunta,
precisamos, antes de mais nada, esquecer determinados prejuízos da Terra.
A natureza do serviço é problema dos mais importantes;
contudo, na própria esfera da crosta é que o assunto apresenta solução mais
difícil.
A maioria dos homens encarnados está simplesmente ensaiando
o espírito de serviço e aprendendo a trabalhar nos diversos setores da vida
humana.
Por isso mesmo, é imprescindível fixar as remunerações terrestres com
maior atenção.
Todo o ganho externo do mundo é lucro transitório.
Vemos
trabalhadores obcecados pela questão de ganhar, transmitindo fortunas vultosas
à inconsciência e à dissipação; outros amontoam expressões bancárias que lhes
servem de martírio pessoal e de ruína à família.
Por outro lado, é indispensável considerar que setenta por
cento dos administradores terrenos não pesam os deveres morais que lhes
competem, e que a mesma porcentagem pode ser adjudicada a quantos foram
chamados à subordinação.
Vivem, quase todos, a confessar ausência do impulso
vocacional, recebendo embora os proventos comuns aos cargos que ocupam.
Governos e empresas pagam a médicos que se entregam à
exploração de interesses outros e a operários que matam o tempo.
Onde, aí, a
natureza de serviço?
Há técnicos de indústria econômica, que nunca prezaram
integralmente a obrigação que lhes assiste e valem-se de leis magnânimas, à
maneira de moscas venenosas no pão sagrado, exigindo abonos, facilidades e
aposentadorias.
Creia, porém, que todos pagarão muito caro a displicência.
Parece ainda distante o tempo em que os institutos sociais poderão determinar a
qualidade de serviço dos homens, porque, para o plano espiritual superior, não
se especificará teor de trabalho, sem a consideração dos valores morais
despendidos.
Essas palavras despertavam-me para concepções novas.
Percebendo-me a sede de instrução, a interlocutora
continuou:
- O verdadeiro ganho da criatura é de natureza espiritual e
o bônus-hora, em nossa organização, modifica-se em valor substancial, segundo a
natureza dos nossos serviços.
No Ministério da Regeneração, temos o
Bônus-Hora-Regeneração; no Ministério do Esclarecimento, o
Bônus-Hora-Esclarecimento, e assim por diante.
Ora, examinando o provento espiritual, é razoável que a documentação
de trabalho revele a essência do serviço.
As aquisições fundamentais constituem-se de experiência,
educação, enriquecimento de bênçãos divinas, extensão de possibilidades.
Nesse
prisma, os fatores assiduidade e dedicação representam, aqui, quase tudo.
Em geral, em nossa cidade de transição, a maioria prepara-se
com vistas à necessidade de regresso aos círculos carnais.
Examinando esse princípio, é natural que o homem que
empregou cinco mil horas, em serviços regeneradores, tenha efetuado esforço
sublime, a benefício de si mesmo; o que despendeu seis mil horas de atividade,
no Ministério do Esclarecimento, estará mais sábio.
Poderemos gastar os bônus-hora conquistados; entretanto, é
mais valioso ainda o registro individual da contagem de tempo de serviço útil,
que nos confere direito a preciosos títulos.
Semelhantes instruções interessavam-me profundamente.
- Poderemos, porém, gastar nossos bônus-hora a favor dos
amigos? - indaguei curioso.
- Perfeitamente - disse ela -; poderemos repartir as bênçãos
de nosso esforço com quem nos aprouver.
Isto é direito inalienável do
trabalhador fiel.
Contam-se por milhares as pessoas favorecidas em "Nosso
Lar", pela movimentação da amizade e do estímulo fraternal.
A essa altura, a genitora de Lisias sorriu e observou:
- Quanto maior a contagem do nosso tempo de trabalho,
maiores intercessões podemos fazer.
Compreendemos, aqui, que nada existe sem
preço e que para receber é indispensável dar alguma coisa.
Pedir, portanto, é ocorrência muito significativa na
existência de cada um. Somente poderão rogar providências e dispensar obséquio
os portadores de títulos adequados, entendeu?
- E o problema da herança? - inquiri de repente.
- Não temos aqui demasiadas complicações - respondeu a
senhora Laura, sorrindo.
Vejamos, por exemplo, o meu caso.
Aproxima-se o tempo do meu regresso aos planos da crosta.
Tenho comigo três mil Bônus-Hora-Auxílio, no meu quadro de
economia pessoal.
Não posso legá-los a minha filha que está a chegar, porque
esses valores serão revertidos ao patrimônio comum, permanecendo minha família
apenas com o direito de herança ao lar; no entanto, minha ficha de serviço
autoriza-me a interceder por ela e preparar-lhe aqui trabalho e concurso amigo,
assegurando-me, igualmente, o valioso auxílio das organizações de nossa colônia
espiritual, durante minha permanência nos círculos carnais.
Nesse cômputo, deixo de referir-me ao lucro maravilhoso que
adquiri no capítulo da experiência, nos anos de cooperação no Ministério do
Auxílio.
Volto à Terra, investida de valores mais altos e demonstrando
qualidades mais nobres de preparação ao êxito desejado.
Ia prorromper em exclamações admirativas, referentes ao
processo simples de ganhar, aproveitar, cooperar e servir, confrontando aquelas
soluções com os princípios imperantes no planeta, mas um brando burburinho
aproximou-se da casa.
Antes que pudesse emitir qualquer observação, a senhora
Laura murmurou, satisfeita:
- Nossos queridos estão de volta.
E levantou-se para atender.
FONTE:
Nosso Lar Pelo Espírito André Luiz psicografia de
Francisco Cândido Xavier.
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